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O Vazio da Solidão

Cada um de nós é um ser único, 

Ainda que acompanhados, 

Teremos sempre um espaço só nosso, 

Uma espécie de vazio onde habita nossa solidão. 

Eis que então, assim o descrevo. 

O número zero,  

Uma situação de completa neutralidade. 

A ausência de posição,  

Não se adota a direção positiva ou a negativa. 

Um ponto perdido no infinito;  

De tão pequeno, é praticamente nada. 

Uma quase insignificância.  

De tão ínfimo, denota ali existir apenas vácuo. 

Um incômodo e pesado vazio na contradição de existir, 

Embora inobservável. 

Crescendo na sua invisibilidade,  

Sendo gerado mesmo que a contragosto. 

Numa evolução contínua,  

Num desenvolvimento obstinado,  

Insistindo em surgir. 

Criando um nó na garganta,  

Cravando aguda dor a dilacerar as fibras do coração. 

Nascendo, finalmente,  

Como que um feto de um sentimento machucado. 

Existindo, mas contrariando a própria existência, 

Numa negação total de si. 

Tentando encontrar consolo no inverso da vida,  

Na idealização heroica da morte. 

Buscando, na razão, o senso lógico; 

Fazendo comparações,  

Descobrindo iguais e diferentes. 

Sentindo o poderoso choque existente  

Entre o vasto infinito e o espaço delimitado. 

Curvando-se à pressão da sensação  

De sufocante e imobilizante clausura. 

Querendo fugir  

Como que fera aprisionada  

Em astuta armadilha. 

Perdendo o olhar na profundidade  

Dos abismos, e na altitude dos picos. 

Reconhecendo haver um confronto  

Entre o que existe de mais alto com o profundo. 

Não conseguindo nisto manter os sentimentos, 

Percebendo-se como que algo oco. 

Uma casca sem conteúdo, um recipiente vazio. 

Desestimulando-se consigo,  

Não se reconhecendo dentre tantos outros.  

Desejando ser comodamente ninguém. 

Desprezando a si, 

Mas também a todos os demais.  

Mergulhando na solidão do ego. 

E na solidão, 

Sentindo a presença de um alguém oculto, 

Brincando de esconder. 

Jogando com o acaso,  

Criando muitas possibilidades, 

Gerando expectativas. 

Culminando num processo de ansiedade  

Por respostas a dúvidas ocultas. 

Num estranho jogo onde tudo pode ser: 

Talvez um “sim”, talvez um “não”.