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Areias e Ventos: Do pó vieste e ao pó retornarás
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- Publicado em Segunda, 05 Março 2018 11:05
- Escrito por GILBERTO MARCON
O apagar de uma individualidade...Figuram numa grande distância passos que ficaram perdidos no passar do tempo. Marcas de quem tinha objetivo de chegar ou simplesmente tinha desejo de andar.
Nisto existindo o despertar de esclarecimentos, mas também a tortura de lembranças vivas. É um cérebro que se curva à grande atividade de ideias e pensamentos, ficando angustiado.
É a fragilidade do corpo que parece não suportar a inquietação do tenso espírito.
São quadros que se formam, um após outro, com lembranças dos porões da memória. Mesclam-se na face a tentativa de serenidade mental a debater-se com confusas emoções.
Pressente um envelhecer prematuro, algo estranho ante a juventude ainda não vivida. Velhas mágoas parecem revitalizar-se, convertendo uma certa tristeza em amargura. Não consegue igualar-se em alegria aos tantos outros que parecem felizes com a vida. Imagina-se como uma espécie de um ser inerte em meio a outros, cheios de movimento.
Os dentes da boca funcionam como barreiras às palavras duras que invadem a garganta. Existe um incômodo estado interior, uma alta tensão subcutânea que esgota aos nervos.
Desejaria além da limitada visão dos olhos, almejaria com olhar desvendar o futuro. Um febril delírio, estranhos sonhos que se misturam com pesadelos, dores da alma eterna.
Avançam os espaços da imaginação com suas ilusões sobre a limitada realidade cotidiana. Talvez veja homens trajados de terno e gravata a dançar com velhas figuras mitológicas.
É nesse conflituoso jogo cerebral que se busca uma solução que parece perder-se no vazio. O raciocínio move-se aceleradamente, querendo fugir do corpo que conclui ser muito lento.
Falta harmonia entre as partes que constituem o ser, está prestes a uma hecatombe individual. Imagens vorazes fluem como que fotografias instantâneas que enchem sem cessar o cérebro.
Surge um desequilíbrio neurológico e os pulmões arfam na busca de ar, como se sufocados.
Um momento crítico, agudas dores pontilham toda a extensão do corpo que se sente exausto. A sensação de tudo estar por frágil fio e nesse sentir haver algo de profundamente familiar. Os ouvidos estão perturbados, creem ouvir sons desagradáveis no choque das nuvens.
Enche-se de impulsiva irritabilidade, pressente forte agressividade, uma árdua competição. Assim é que vê que o azul do céu e o branco das nuvens querem devorar-se mutuamente. É com amargura que reconhece que essa imagem reflete a velha e a atual humanidade.
Gostaria de fugir, de rejeitar viver aquele momento, desejaria que fosse possível desaparecer.
As pernas, entretanto, recusam-se a se movimentar. Domina-lhe um pesado abatimento.
Deita-se sobre o solo, abandona-se na horizontal.
Fica ali, escravo de densa imobilidade. E de instante para outro todas as cores do quadro vão ganhando um tom de cor areia. E a cor domina, transforma todas as figuras da imagem
em partículas de fina areia. E esta vai dizimando-se até transmutar-se em poeira, até chegar a estado de ínfimo pó.
A criação de um deserto. Um riacho tenta surgir, mas logo seca, a aridez é intrépida. Nem o azul do céu, nem o branco das nuvens. A areia a ambos devorou, sem piedade.
É quando surge, de surpresa, uma turbulência que gera revoltoso e forte vendaval. É movimento de massa impalpável sobre a fraca solidez do relevo das figuras de pó.
É com fúria guerreira que no seu bafejar vai aniquilando a tudo que está à sua frente. É o vento que carrega toda areia que agora é apenas insignificante pó. É o vento que a tudo leva!