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VAMOS LER “FIGURINHAS”!

Por Maria Nicolau – Doutoranda na UNIVÁS (Universidade do Vale do Sapucaí), orientanda da professora Dra. Maria Onice Payer. Bolsista da FAPEMIG.

Ultimamente, corremos o risco de ter pessoas envolvidas com a perspectiva de saudar em demasia o inicio da Copa de 2018. Digo isso, não porque sou contra esse fato num certo sentido, exceto com relação às questões que a cerceiam. Narro aqui alguns acontecimentos ocorridos desde o dia 18 de março e que vem se repetindo ao longo do tempo com o ato de trocar figurinhas “repetidas”.

            A meu ver, algumas pessoas seguem um ritual que não vale nada e é terminantemente lamentável. A questão que cerca essa postura foi minha percepção das pessoas correrem às revistarias da cidade, provocando um movimento intenso, naquele dia.

Em uma delas em que fui comprar jornal, passei a observar atitudes que acabaram com o ar poético que eu havia colhido antes de minha chegada pelos arredores das praças de São João. Um choque provocado pelo alvoroço que havia no local deixou claro que o mais importante que um jornal, era obter um álbum. A leitura de um jornal não era interesse de ninguém. Mas sim, em ler “figurinhas”.

Havia uma avidez muito grande, quase desesperadora, para encontrar o álbum o mais rápido possível. Por esta razão, a venda dos jornais se esgotou rapidamente. As pessoas estavam mais interessadas em comprar o jornal por causa das figurinhas. E na sua maioria dizendo que eram para os filhos, não para eles.

            No entanto, ao ouvir de um consumidor pedindo no balcão “eu quero R$ 100,00 de figurinhas”, pensei no quanto ele estava se sentindo empoderado, como é comum se dizer hoje em dia. Aquilo para mim não fazia sentido.

            Posso acrescer que, fiquei pensando no poder aquisitivo daquela pessoa ao gastar tal quantia de dinheiro em figurinhas. Indaguei sobre o poder intelectual dela, ou se era possível que tivesse alguma leitura sobre si mesma. Pergunto-me, o que será que uma pessoa dessas passa para os filhos gastando esse valor em figurinhas? Deve ser um punhado de leitura ou produção? Imagine quem gasta R$ 5000,00 por um álbum completo?

            Será que tal consumidor compra livros, lápis pretos ou coloridos, ou até mesmo pincéis para dar cor à vida de seus filhos? Talvez fosse mais interessante do que ler “figurinhas”. Ou até mesmo, poderiam desenhar figurinhas, e seria mais criativo.

            Eu fico triste com isso, e indago: “vamos ler figurinhas?”. No fundo, elas já começam a saltar aos olhos de pessoas adultas, de crianças, de jovens que vão comprar cada vez mais para as colarem em seus queridos álbuns. Fiquei bastante impressionada com o alvoroço daquele gesto, o qual só servirá para incentivar o consumo de um produto. 

Não há como ignorar a avidez e pressa de uma mocinha que estava na fila para pagar sua compra, quando perguntei se alguma vez havia lido jornal e ela me respondeu que não. Temo por ela e por aqueles que se preocupam em trocar figurinhas repetidas, pois são só desculpas para não crescer.

            Numa das idas às revistarias, percebi aumentar o movimento de trocas. Tirei foto de dois rapazes que estavam concentrados e marcando num papel quantas figurinhas ainda faltavam para completar seus álbuns. Ao perguntar sobre o que faziam com as repetidas. Um deles, Vinícius Bianchetti de 18 anos, me disse que “quando não tem troca a gente pode vender as figurinhas”.

            Desse modo, percebi o quanto tudo não passa de consumo. Deixo aqui meu abraço de misericórdia para os torcedores brasileiros que se empenham, mas ficam atrás de figurinhas. Pensemos o que eles podem trocar, mas que não seja algo para completar álbuns. Desconfio que haja algo maior por trás desse gesto. Algo que não seja produto de consumo, como o jogo, o tal álbum. Mas sim fazer valer novos sentidos.

            Ora! Vamos trocar figurinhas por letras! Essas, sim, fazem parte de um crescimento.